Bicicleta dramática
Este
belo e terrível texto, tive acesso no outono de 1969. Refleti muito sobre sua
significância e trouxe-o para minha vida, repleta de despedidas, portos e
estradas. Nunca vivi um amor na sua confiança plena ou na plenitude da confiança,
da estabilidade cumplice. Sempre foram sustos, surtos, distancias. Neste
momento, este belo texto é algo como um espelho na minha trajetória...
VEJO
PELA JANELA Um homem numa bicicleta roxa, de camisa roxa. Cores tão roxas como
meu coração e minha esperança neste momento. O mundo desmorona sobre mim e não
sei o que fazer, simplesmente quedo-me pasmo e a beira da estrada. Mais uma vez
largado a seu próprio destino e a beira da estrada.
Mas
não quero lamentar. Só não sei o que fazer. Não quero chorar, virar mendigo,
ficar bêbado, chorando e chorando, ouvindo minhas musicas e chorando. Amor
nunca é demais, proximidade, evidencias de que não há amor. Simples porque há
tantos tipos de amor, tantos.
Sinto-o
chegando com seu passos pesados, sua
bunda enorme e bonita, seu cheiro, cabelos de índio, passadas de negro.
Não
quero chorar. Apenas a dor é tamanha que empasta tudo, vejo apenas o roxo e a
dura semelhança entre a bicicleta e minha vida. Não adianta esforço, luta, resistência.
Não adianta nada, porque vou perder mesmo, já perdi tudo, tenho apenas a
vida...ainda.
Flagelos
que busquei, não escutei alertas, acreditei. Apesar de ver sinais o tempo todo.
Porque ele ficou enquanto todos foram? Mentiras, construção de outra vida,
busca exclusiva por dinheiro. Mas tantos anos cativo? Amor com data e hora
marcados, em dosagem mínima, viciante. Eu cego ou apaixonado ou agradecido pelo
ultimo a ficar mesmo com tantas opções? Agora estou só e resistirei ? não vou
destruir o que resta como nas outras vezes? Agora não tenho mais idade, é
resistir ou a mendicância. É preciso estar alerta e construir outra vida, ainda
há tempo, ainda há tempo.
Ah,
o homem da bicicleta? Certamente nunca mais o verei, passou. Como tudo nesta
vida passa.
A
introdução é ficção. Escrevi esse texto num momento de extrema dor e decepção
com uma certa pessoa em março 2016
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