Movimentos
protestam por reabertura do Cine Olinda, fechado há mais de 35 anos
Sumaia
Villela - Correspondente da Agência Brasil
Fachada do Cine Olinda, fechado há mais de 35 anos
para reforma. Movimentos de audiovisual defendem a reabertura do espaço André
Dib/CineRua
Fechado há mais de 35 anos, o
Cine Olinda, que leva o nome da cidade histórica de Pernambuco onde está
localizado, voltou a receber hoje (5) uma mostra de filmes. A exibição, no
entanto, teve que ser feita do lado de prédio, já que o espaço está fechado
para reforma há décadas. A sessão de filmes na rua foi programada justamente
para chamar a atenção para o problema, como um protesto.
“Essa reforma é mais velha que
eu. Muitas pessoas nem sabem que isso é um cinema. Esperamos que com essa
atividade ao lado do cinema as pessoas olhem para ele, saibam da sua existência
e cobrem do Poder Público a conclusão da reforma e a abertura desse equipamento
cultural”, disse integrante do movimento CineRua Karuna de Paula.
O Cine Olinda, que em 2016
completa 105 anos, foi fechado em 1965. De acordo com pesquisa feita pelo
movimento CineRua, após o fechamento, o prédio teve vários fins – de armazém de
açúcar a alojamento para desabrigados – até ser desapropriado em 1979. Em 1981,
a primeira tentativa de reforma para devolver o cinema ao local não foi
concluída.
O prédio é um exemplar da
arquitetura Art Déco, típico das décadas de 1920 a 1940, e estava em ruínas até
a restauração da estrutura entre 2003 e 2004. A Prefeitura de Olinda concluiu o
serviço, mas argumentou na época que não havia recursos para montar o cinema e
fazê-lo funcionar.
Quatro anos e uma tentativa
frustrada depois, o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional
(Iphan) assumiu o projeto, mas questões burocráticas prejudicaram o andamento
dos trabalhos. A última notícia foi a suspensão do contrato com a empresa que
ganhou a licitação para realizar o serviço, em março de 2016.
Em 2008, o Cine Olinda chegou a
ser aberto para abrigar alguns eventos, como a Mostra de Cinema Sapo Cururu, e
em 2011 foi um dos espaços da Casa Cor, mostra e arquitetura e design. A sala
de exibição, no entanto, nunca ficou pronta, reduzindo ainda mais o número de
cinemas de rua na região. E Olinda e Recife vários estabelecimentos do tipo já
fecharam diante da competição com as grandes companhias exibidoras instaladas
em shoppings.
Cinemas de rua
A valorização dos cinemas de rua
é a bandeira do movimento CineRua. “A sociabilidade do cinema de rua é
diferente do cinema de shopping. A relação de intimidade e de
propriedade é diferente. Tomamos como exemplo o Cine São Luiz, o maior daqui
[do Recife]. Tem um preço acessível e atrai pessoas que estão saindo do trabalho,
marcam encontro com o namorado, estão esperando uma loja abrir ou encontrar uma
pessoa. A ida ao cinema pode ser mais ocasional”, disse Karuna de Paula.
A ativista defendeu também a
necessidade de espaços para exibição de produções independentes, sobretudo
nacionais e pernambucanas, já que cinemas de shopping ocupam quase todas
as suas salas com superproduções estrangeiras. “Pernambuco é um dos estados com
maior produção atual, e de qualidade. É preciso escoar tudo isso, e os cinemas
de rua tem essa característica. Exibem filmes que falam com o local, que
problematizam a realidade.”
O CineRua, o movimento Ocupe o
Cine Olinda e o Ponto de Cultura Cinema de Animação divulgaram e recolheram
assinaturas para um manifesto que será entregue aos órgãos públicos
responsáveis pelo cinema, como o Iphan e a Prefeitura de Olinda. “Reivindicamos
o Cine Olinda não apenas como sala exibidora de cinema independente, dando
vazão a uma importante produção ignorada pelo mercado, mas como um núcleo de
formação, produção e exibição, um centro cultural capaz de abrigar pontos de
cultura e outros núcleos aglutinadores da produção criativa”, diz um trecho do
documento.
Atividades pela reabertura do Cine Olinda incluíram
exibição de curtas-metragens, feira de artesãos e música Sumaia Villela/Agência Brasil
No manifesto, os grupos pedem
ainda que o Iphan e a prefeitura esclareçam publicamente a atual situação e a
gestão do equipamento, “e que se coloque em discussão estratégias e soluções
para que ele seja entregue à população ainda este ano”. O manifesto também pede
a realização de uma audiência pública em até 30 dias, com participação do
Ministério Público, para definir formas de ocupação e de reinício das obras,
além da criação de um comitê de fiscalização para acompanhar as providências.
Filmes, música e feira
Na programação de hoje (5),
estavam em cartaz curtas-metragens que tinham como tema o sítio histórico da
cidade e o próprio Cine Olinda. Depois da exibição, os autores participaram de
um debate. O encerramento ficou por conta da exibição especial de Noturno em
Ré-cife Maior (1981), de Jomard Muniz de Brito, com trilha sonora ao vivo do
músico e compositor Johann Brehmer.
Também houve projeções na fachada
do prédio, uma feira de artesãos e música, que atraiu muitos moradores das
redondezas. Na plateia, duas moradoras da comunidade da Praia dos Milagres
levaram os filhos para assistir aos filmes. Uma delas, a empregada doméstica
Maria da Conceição Albuquerque da Silva, 42, é personagem de um documentário
exibido no local, Milagres, e gostaria de ver o filme dentro do Cine Olinda.
“Ficava mais bom, né? Ficava mais bonito, mais legal pra gente assistir.”
A amiga Gilvaneide Araújo, 30,
sabia que o prédio era um cinema, mas achava que o espaço estava abandonado. A
dona de casa acredita que a comunidade poderia se beneficiar com o equipamento
cultural. “Seria ótimo, principalmente pras crianças.”
Por anos, uma salinha de cinema
foi montada no Clube Atlântico, ao lado do Cine Olinda, onde a artista plástica
Maria Luísa Mendes Lins, 69, conhecida como Isa do Amparo, lembra de ter visto
um festival de animação. Nascida na Bahia, ela mora há 35 anos no município – e
quando chegou o Cine Olinda já estava fechado.
Edição: Luana
Lourenço
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